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#Paulinho da Viola

Paulinho da Viola em forma plena

Juremir Machado conta como foi o show de Paulinho da Viola, que se apresentou para um Araújo Vianna lotado.

Juremir Machado da Silva
#Paulinho da Viola17 de abr. de 233 min de leitura
Juremir Machado da Silva17 de abr. de 233 min de leitura

Aos 80 anos de idade, Paulinho da Viola mostrou no Araújo Vianna, em Porto Alegre, no sábado à noite, que está no melhor da sua forma. Fisicamente, em plena forma. Esteticamente, em forma plena. A sua voz natural, que parece jamais fazer um esforço para se projetar ou sair do trilho suave, expandia-se no ar com a afinação de sempre. Faz cinquenta anos que escuto Paulinho da Viola e parece que para as suas canções o tempo não passou. Doce ilusão. A passagem do tempo se vê na plateia: sexagenários como eu, gente que nasceu bem antes de mim e, de vez em quando, alguém na exuberância dos quarenta anos. Paulinho canta lentamente demais para a galera acelerada dos dias de hoje.

E Paulinho cantou os mestres da Velha Guarda, sem esquecer nosso genial Lupicínio Rodrigues. Cantou e lembrou dos grandes da Portela e da Mangueira. Ele chegou a uma idade em que já pode lembrar que, com Hermínio Bello de Carvalho, gravou em fita cassete um samba de louvor à Mangueira e, quando viu, a música estava inscrita num festival. Tentou convencer Hermínio a retirar, alegando que era portelense e que seria uma saia-justa para ele, mas não levou. Se na época ninguém o censurou, imagina hoje. Em casa lotada, Paulinho foi ovacionado. Lembrei de meu amigo David Coimbra, que nos deixou tão cedo. David adorava Paulinho da Viola e conhecia suas músicas de cor.

Claro que o público da minha idade se agita quando Paulinho canta “Pecado capital” No meu caso sempre vem à mente a novela da Globo, dos anos 1970, que a gente via, em Santana do Livramento, na casa do vizinho, pois ainda não tínhamos televisão. A adolescência salta da alma, dá pinotes, sacode os cabelos longos e canta junto com o artista. Até se pode misturar as letras e dizer que “pecado capital” foi um rio que passou em nossa vida. Dinheiro na mão era vendaval na novela em que Francisco Cuoco interpretava Carlão. Em nossas mãos, dinheiro era apenas miragem, utopia, esperança e projeto de futuro.

Levamos nosso amigo francês Philippe Joron para ver e ouvir Paulinho da Viola. Philippe está em Porto Alegre como convidado do Programa de Pós-Graduação em Comunicação social da PUCRS. Senti na vibração dele, durante o show, que a arte de Paulinho casa muito bem com o seu imaginário. Philippe fala português, já viveu no Brasil, é casado com uma pernambucana. Na linguagem filosófica cara a nosso mestre Michel Maffesoli, com sua lógica do assentimento, dizer sim à vida apesar dos pesares, a música de Paulinho da Viola parece inscrever-se no sentimento trágico da existência. O drama espera um desfecho, uma solução, uma ruptura. O trágico ajeita-se com o mundo. Diz Maffesoli que “o dramático é apanágio do indivíduo”, enquanto “o destino trágico privilegia a comunidade”, o nós, o em comum.

#Paulinho da Viola
Araújo Vianna
Porto Alegre