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#Frederico Bartz

Lugares da Classe Trabalhadora em Porto Alegre 11: A Praça XV de Novembro

Na Parêntese 168, Frederico Bartz conta dos trabalhadores da Praça XV de Novembro em Porto Alegre na era colonial

Frederico Bartz, na revista Parêntese
#Frederico Bartz 3 de abr. de 234 min de leitura
Frederico Bartz, na revista Parêntese3 de abr. de 234 min de leitura

A região onde hoje se localiza a praça XV de Novembro esteve vinculada ao trabalho e à classe trabalhadora desde antes de sua delimitação como logradouro público. Em 1781, ainda no período colonial, um comerciante contratou a construção de um mercado de peixe na praia ao norte da vila de Porto Alegre, o que pode indicar uma das origens da vocação comercial daquela área. No final do período colonial, toda a região entre a praça XV e a praça Montevidéu era conhecida como Porto dos Ferreiros, o que indica uma associação do lugar com determinada atividade profissional. 

No começo do século XIX, surgiu na Câmara Municipal um projeto para delimitar um largo naquela região, que ficou conhecido como praça do Paraíso e mais tarde praça Conde D’Eu. Em 1820, as quitandas e o comércio ambulante foram transferidas da praça da Alfândega para a praça do Paraiso; em 1844, foi construído o primeiro Mercado Público e, em 1869, foi inaugurado o atual Mercado Público nessa mesma praça. Nesse meio tempo foram instaladas as Docas na região próxima do Mercado e estavam sendo inauguradas as primeiras fábricas no Caminho Novo (atual Voluntários da Pátria). Durante o século XIX, essa parte da cidade era um local de convergência para muitos trabalhadores escravizados e livres, principalmente da comunidade negra, que exerciam atividades diversas como quitandeiras, marinheiros, artesãos e carregadores. 

No final da década de 1880, no Rio Grande do Sul, se iniciou um processo organizativo que reuniu artesãos, operários e pequenos industriais, em uma aliança que tinha por objetivo defender os interesses do mundo do trabalho urbano. Desse processo surgiram a Sociedade Beneficente União Operária e a Liga Agrícola Industrial, que tinham como uma das principais bandeiras o protecionismo econômico e a crítica do livre comércio. Foi nesse contexto que a classe trabalhadora da capital da Província foi convocada para participar de uma passeata contra a tarifa especial no dia 5 de maio de 1889, para mostrar seu descontentamento com a política econômica do Governo Imperial. O ponto de concentração foi a praça Conde D’Eu, que era um local de grande presença de trabalhadores e trabalhadoras, que circulavam em torno do Mercado Público, das Docas e da Voluntários da Pátria. O grupo seguiu com duas bandas de música e cinco estandartes, subindo até o palácio do presidente da Província, na praça da Matriz, onde foram feitos discursos, dispersando-se depois de descerem para a rua Doutor Flores. 

Quase um ano depois essas mesmas entidades chamaram uma nova demonstração pública: a situação política e as pautas haviam mudado, isso porque com a proclamação da República as organizações operárias haviam se aproximado bastante do Partido Republicano e compartilhavam uma pauta crítica à política de encilhamento do Governo Federal, pois acreditavam que a emissão de dinheiro pelos bancos desorganizaria a economia, prejudicando especialmente as famílias proletárias. A Diretoria da Liga Agrícola Industrial convocou os trabalhadores e o povo em geral para se reunir no dia 28 de abril de 1890, na praça XV de Novembro (antiga praça Conde D’Eu). Uma grande multidão se juntou no local, onde foram pronunciados alguns discursos, com o grupo se dirigindo posteriormente para a praça da Matriz, fazendo algumas voltas pelas ruas do Centro, até se dispersarem na praça da Alfândega.

Os protestos contra a tarifa especial em abril de 1889 e contra o encilhamento em maio de 1890 foram importantes porque foram as primeiras grandes manifestações públicos do nosso movimento operário. Nos dois casos, é importante destacar a praça XV como ponto de partida desses trajetos, pois ao escolher esse local os organizadores das manifestações sabiam que trabalhadores e trabalhadoras que circulavam por ali reforçariam a corrente humana que iria se movimentar pelas ruas. Foram as quitandeiras que vendiam seus quitutes na praça, os marinheiros e carregadores que trabalhavam nas Docas, os operários que saíam das fábricas e oficinas da Voluntários da Pátria e a multidão que frequentava o Mercado Público, que formaram essas primeiras colunas operárias que cruzaram Porto Alegre.

 Nos anos seguintes o movimento operário mudou de orientação, e os republicanos foram substituídos pelos socialistas e depois pelos anarquistas, mas a região da antiga praça do Paraíso continuou sendo um espaço de encontros para trabalhadores de diversas categorias. No final dos anos 1920, por exemplo, o Bloco Operário e Camponês tinha sua sede na praça Parobé, sendo que alguns comícios eram feitos na praça XV, e durante os anos 1930 o Círculo Operário, vinculado à Igreja católica, promoveu uma missa campal naquele logradouro. Resgatamos aqui a história daquelas primeiras manifestações para recordar que foi na praça XV de Novembro que se iniciou essa longa tradição de realizar caminhadas e tomar as ruas como forma de protesto operário, mostrando como esse lugar foi importante para a história da classe trabalhadora da capital.

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Praça XV