#1935
1935 – O centenário da Revolução Farroupilha
Na revista Parêntese 169, o historiador Arnoldo Walter Doberstein analisa a Revolução Farroupilha que completa 100 anos
Arnoldo Walter Doberstein, da revista ParênteseNo ano de 1935 a Porto Alegre dos imperiais, que resistiu à invasão farroupilha, celebrou o centenário do levante dos farrapos. Como todas as efemérides centenárias de data redonda (fora algumas exceções, quando alguns oportunistas tentam se apropriar daquilo que é comum a todos), foi uma ocasião de efusivas comemorações.
O Centenário Farroupilha, como acontecimento histórico, pode ser visto na ótica cristã-criacionista, que procura em tudo um único marco inicial (o Deus criador). Ou no esquema do evolucionismo-difusionista, que vê as coisas como um contínuo linear de causas e conseqüências, com um único foco irradiador. Nestes dois esquemas interpretativos, o Centenário Farroupilha poderia ser visto, então, como o fato gerador do futuro MTG (anos 1950). E uma terceira, dentro do que poderíamos chamar de causação circular. Uma coisa sendo puxada por outra, que se volta sobre a primeira, passando então a puxá-la. Como um cusco dando voltas em torno do próprio rabo.
Na causação circular, o Centenário Farroupilha poderia, pois, ser visto como parte de um processo. De afirmação do gauchismo. Anteriormente influenciado pela literatura regionalista da década de 1920, e pelas “revoluções” de 1930 e de 1932, para depois reforçar tais movimentos. No plano nacional, como inserido no processo de procura de símbolos que representassem toda a nação. São Paulo tinha o Bandeirante. Os mineiros, Tiradentes. Os nordestinos, Padre Cícero. E nós, o gaúcho fazendeiro-militar-armado.
1935 – O centenário da Revolução Farroupilha – Representações
O grande evento do ano foi a Exposição do Centenário. Uma mega-feira industrial, agrícola, cultural e artística, sediada no Parque da Redenção, com seu pórtico monumental precedido, no último dia da Exposição (15.01.1936), da estátua de Bento Gonçalves (Fig. 1), executada na Alemanha por Antônio Caringi, sob a inspiração de Hermann Hann, futuro escultor oficial do III Reich. Um outro espaço do Parque recebeu dos uruguaios a estátua do pachorrento Gaúcho Oriental (Fig. 2, esquerda), de Frederico Escalada. O qual caiu mais no agrado dos porto-alegrenses que o fleumático Bento Gonçalves, de Caringi. Que o diga Elisabeth Laky Gatti (Fig, 2, direita).
A Revista do Globo e seus ilustradores entraram na causação circular. Empolgados e empolgando o Centenário Farroupilha. Nelson Boeira Faedrich (P.Alegre, 1912 – Idem, 1994) com uma magnífica gravura de um gaúcho a pé, tema também desenvolvido, numa dimensão menos heróica, por Cyro Martins (Fig. 3). Edgar Koetz (P. Alegre, 1914 – Idem, 1969) preferiu acompanhar a euforia geral com um gaúcho gineteando um pingo ao qual só faltaram as asas para se transformar num Pégaso (Fig. 4).
Em termos de monumentos públicos, as “forças vivas da cidade” estiveram praticamente adormecidas no Centenário da Independência (1922). Em 1935 elas se atiçaram. Dotaram a cidade do Monumento a Sepúlveda, ofertado pela colônia portuguesa (Fig. 5 – esquerda), o Obelisco da colônia judaica (Fig. 5, centro) e a coluna sírio-libanesa (Fig. 5, direita). Estes dois últimos testemunhando que Porto Alegre é uma das cidade que mais passivamente assiste ao vandalismo e furto de seus monumentos.